EPI não evitam acidentes e são desconfortáveis – Por Heitor Borba.

Os EPI – Equipamentos de Proteção Individual[1] são obrigatórios, mas NÃO evitam acidentes e ainda são desconfortáveis (pronto! falei).

Nos artigos, aulas e palestras sobre EPI sempre veiculam as mesmas falácias: “EPI não são desconfortáveis e evitam acidentes”. Na verdade os EPI são MUITO desconfortáveis (principalmente quando utilizados de forma incorreta) e NÃO evitam acidentes. Dizer o contrário para os trabalhadores é insultar a inteligência dos mesmos. Isso nunca motivou nenhum trabalhador a usar EPI. O sofrimento causado pelo uso do EPI pode ser maior do que o risco que ele corre se abstendo do mesmo por alguns minutos.

Tenho alertado sempre sobre a necessidade de mudança do atual pensamento prevencionista. E para que isso mude é necessário mudar primeiro os nossos despreparadíssimos professores. A julgar pelas constantes insanidades prevencionistas que recebo via e-mail, de profissionais, professores e alunos, alguns até ostentando títulos disso e daquilo (como se isso fosse causar intimidação), percebo o nível de capacitação e atuação desses profissionais. Coitados dos trabalhadores que ficam expostos aos riscos e dos empresários que pagam por isso.

Os EPI não evitam acidentes. Quem evita o acidente são os trabalhadores, treinados e conscientizados corretamente. Os EPI apenas evitam ou reduzem a lesão que o acidente causaria caso o trabalhador não tivesse utilizando corretamente os equipamentos adequados. O uso de botinas de segurança com palmilha de aço, por exemplo, não evita que o trabalhador pise em alguma tábua com pregos; o uso de capacete não vai evitar que algum tijolo caia na cabeça do usuário do EPI; o uso de protetor auricular não evitar que o ruído se propague pelo ambiente (do ponto de vista prevencionista a propagação do ruído já é o acidente), e assim por diante.

Este filme produzido pela PETROBRÁS[2] reconstitui virtualmente alguns acidentes reais e fatais ocorridos em suas instalações. Um deles descreve o acidente de um trabalhador que caiu da coberta, a 2,50 m de altura, quando retirava as telhas através da remoção dos grampos de fixação.

FOTO 01

Na foto acima podemos visualizar o cenário do acidente: Com um pé de cabra e sobre uma escada de abrir segurada por outro trabalhador a vítima prosseguia com a remoção dos grampos para retirada das telhas…

FOTO 02

…mas em dado momento a vítima de desequilibrou e caiu sobre a telha que quebrou com o seu peso…

FOTO 03

…caindo de cabeça sobre o piso e ocasionando a sua morte.

Pergunto, quais medidas preventivas necessárias e suficientes deveriam ter sido executadas para evitar que o acidente ocorresse?

A resposta: “Usar o cinto de segurança preso na madeira da coberta” quando vinda de um trabalhador eu ainda fico feliz. No entanto é inadmissível que um profissional de segurança do trabalho, que se acha prevencionista, apresente uma resposta leiga dessa. O cinto de segurança não evitaria o acidente, apenas a lesão. O trabalhador iria cair do mesmo jeito, apenas não bateria no piso causando a sua morte. É só isso que você como profissional de segurança do trabalho sabe fazer? Empresas: Demitam seus SESMT.

Para quem ainda não sabe, as medidas preventivas seriam:

a)    Aptidão para trabalhos em altura (ASO);

b)    Capacitação para trabalhos em altura (Treinamento NR-35);

c)    Autorização para trabalhos em altura (Formalização);

d)    Liberação para trabalhos em altura (APR, PT, procedimentos);

e)    Escada de dois montantes ultrapassando em 1 m a altura da madeira ou linha da coberta (para apoio do peito do trabalhador) ou andaime completo;

f)     Segmento de tábua de 0,30 m x 1” (prancha) para apoio do peso do corpo através da mão esquerda;

g)    Cinto de segurança tipo paraquedista preso na madeira da coberta ou em linha de vida dimensionada e demais EPI (capacete com jugular, óculos, luvas, botinas);

h)    Iniciar a retirada das telhas pela parte de baixo e da borda para dentro, utilizando um andaime simples apoiado;

i)     Retirada a primeira telha, posicionar a escada com um segundo trabalhador segurando a escada na parte de baixo;

j)      Subir a escada, prender o cinto de segurança na linha da coberta e colocar a prancha apoiada sobre duas madeiras;

k)    Executar o serviço apoiando o peso do corpo sobre os montantes da escada e sobre a prancha.

Ainda poderia amarrar os montantes da escada na linha.

Isso sim teria evitado que essa morte horrível ocorresse. A concepção simplista de que o EPI evita acidentes é bem a cara dos leigos. Profissionais da prevenção tem a obrigação de saber que apenas os EPI não constituem medidas preventivas.

Os EPI não são confortáveis e nem é gostoso usar EPI. Os trabalhadores utilizam porque é obrigatório e sabem que serão punidos caso não utilizem.

Os DDS – Diálogos Diários de Segurança e outros treinamentos não surtem efeito sobre os trabalhadores por causa dessas informações politicamente idiotas que os profissionais insistem em repassar. Simplesmente impor faz com que os trabalhadores utilizem os EPI apenas nas vistas dos fiscais. Você que se diz prevencionista vai estar dentro de um espaço confinado para verificar o uso dos EPI durante toda a execução da atividade e de modo ininterrupto? Não vai, né?

Os treinamentos sobre a necessidade quanto ao uso dos EPI por parte dos trabalhadores, além dos assuntos técnicos necessários, devem também conter informações sobre prevenção de acidentes e dicas para minimizar o desconforto causado pelos equipamentos. Falar a verdade é bom porque não faz os outros de bobo e gera um clima de confiança entre prevencionista e empregados.

Lembro de uma empresa em que participei de uma das reuniões da CIPA como convidado. Em certa altura da reunião, o presidente abriu a sessão para apresentação de propostas e sugestões. Ninguém queria falar nada. Mas os representantes do empregador, geralmente gerentes e encarregados, começaram a insistir para que os trabalhadores falassem alguma coisa: “Vai fulano fala… É, vai fala, fala!…”[sic].  No entanto, quando alguém falava alguma coisa (geralmente contra a empresa que não era muito boa em segurança) levava a maior bronca do chefe. Eu não resisti e cai na gargalhada. Até então nunca tinha visto tamanho absurdo. É vivendo e desaprendendo…

Mas vamos voltar ao treinamento. Inicie o treinamento falando sobre a parte legal (NR-06, CLT e procedimentos da empresa). Continuando com o reconhecimento dos riscos das atividades por função e seguindo-se da parte técnica (indicação por risco, especificação, limitação, nível de proteção, uso correto, guarda, conservação, durabilidade média, incompatibilidades com outros EPI, higienização, etc). Finalize reconhecendo o desconforto causado pelo EPI e apresente dicas para reduzir esse desconforto.

As dicas para minimização do desconforto causado pelo EPI devem apresentar soluções viáveis para no mínimo:

a)    Reduzir o incômodo;

b)    Eliminar bolhas, calos, foliculites (pé de cabelo), bromidroses – tipo plantar (chulé), pé de atleta (frieira), restrição de movimentos e visão, incompatibilidades, etc

A consciência prevencionista vai além da legislação e da ciência, mas é constituída também por um conjunto de fatores e valores, como por exemplo, visão prevencionista, conhecimento bom senso, honestidade, ética, humanismo, compreensão, etc

Artigos relacionado:

http://heitorborbainformativo.blogspot.com.br/2013/06/heitor-borba-informativo-n-58-junho-de.html

(Artigo: “Gerenciando a abstinência do EPI”).

Webgrafia:

[1] EPI

http://portal.mte.gov.br/data/files/8A7C816A47594D04014767F2933F5800/NR-06%20(atualizada)%202014.pdf

[2] Filme “Boas práticas em alturas” da PETROBRÁS, produzido pela UPXSTUDIO

(Não sei se está disponível na net).