Cinto de segurança paraquedista: Talabarte “Y” ou trava-quedas? – Por Heitor Borba

Este artigo foi motivado pelas dúvidas de alguns leitores em relação ao uso do cinto de segurança paraquedista.

Na maioria dos casos os colegas que trabalham na área de segurança do trabalho reclamam das intromissões dos engenheiros e gestores das empresas e de suas interpretações bizarras dos textos legais. Em verdade, isso não é novidade, tendo-se em vista que alguns colegas, que possuem formação específica nessa área, também não sabem interpretar os textos das NR.   Novamente reitero aqui a necessidade quanto à obrigatoriedade de inclusão da disciplina “interpretação de textos” nos cursos de segurança do trabalho.

No artigo “Interpretação dos textos legais”[1] apresentei alguns casos bizarros de interpretação dos textos legais e falei da necessidade de inclusão dessa disciplina nos cursos de segurança do trabalho.

Pois bem. As bizarrices continuam e com as bênçãos dos queridos psicopedagogos de plantão, que entendem de tudo sobre educação (SQN). São tão queridos que deixei as salas de aula por causa deles.

O presente artigo também foi motivado por bizarrices presenciadas nas empresas e promovidas pelos especialistas em segurança do trabalho de plantão (toda empresa tem um), além das enviadas pelos leitores.

Nesse caso, as dúvidas surgem em relação ao uso do cinto de segurança paraquedista.

Esses equipamentos devem ser utilizados:

a)    Sempre com talabarte “Y”?

b)    Sempre com talabarte “Y” acoplado a trava-quedas?

c)    Apenas com trava-quedas?

d)    Apenas com talabarte “Y”?

e)    Dependendo da situação pode ser utilizado com talabarte “Y” ou com trava-quedas?

f)     Dependendo da situação pode ser utilizado com talabarte “Y” e com trava-quedas?

Se você respondeu acertadamente a questão acima, já pode prestar um concurso público na área.

Mas vamos à resposta. Na NR-18[2] temos os seguintes textos sobre uso de cintos de segurança:

18.15 Andaimes e Plataformas de Trabalho

18.15.2.7 Nas atividades de montagem e desmontagem de andaimes, deve-se observar que:

a) todos os trabalhadores sejam qualificados e recebam treinamento específico para o tipo de andaime em operação;

b) é obrigatório o uso de cinto de segurança tipo paraquedista e com duplo talabarte que possua ganchos de abertura mínima de cinquenta milímetros e dupla trava;

Mas por que há essa obrigação?

Por causa desse item:

“18.23.5 Em serviços de montagem industrial, montagem e desmontagem de gruas, andaimes, torres de elevadores, estruturas metálicas e assemelhados onde haja necessidade de movimentação do trabalhador e não seja possível a instalação de cabo-guia de segurança, é obrigatório o uso de duplo talabarte, mosquetão de aço inox com abertura mínima de cinquenta milímetros e dupla trava.”

Ou seja, não sendo possível instalar linha de vida os trabalhadores citados nas atividades acima podem prender o talabarte do cinto na própria estrutura, desde que a estrutura esteja devidamente fixada e segura, claro.

Nos serviços de montagem de torres de andaimes, como os utilizados na construção civil, é permitido aos montadores prenderem os talabartes dos cintos nas peças dos andaimes. A legislação não diz, mas como segurança do trabalho não é apenas legislação, mas também técnica, os ganchos dos talabartes devem ser fixados nas peças principais (mais robustas) devidamente fixadas na torre e na posição horizontal. As peças mais finas, inclinadas ou posicionadas na vertical não devem ser utilizadas para fixação dos cintos. Também, nesse caso, a torre em montagem deve ser fixada na estrutura através de todas as peças principais ou montantes. Se segurança do trabalho fosse apenas legislação não havia necessidade de cursos de segurança do trabalho e nem de profissionais habilitados. Bastava a qualquer um ler a legislação e já teria condições de executar as normas. Desnecessário dizer que alguns “profissionais” de segurança do trabalho deixam que os outros tomem as decisões de execução da legislação em seu lugar. O que deve ser feito é apresentar ao empregador as opções técnicas e legais aplicáveis. Caso o empregador não acate, o problema já não é mais do profissional.

Para os demais casos, deve ser utilizado o cinto de segurança preso diretamente no trava-quedas, sem uso do talabarte “Y”:

ANDAIMES SUSPENSOS

18.15.31 O trabalhador deve utilizar cinto de segurança tipo pára-quedista, ligado ao trava-quedas de segurança este, ligado a cabo-guia fixado em estrutura independente da estrutura de fixação e sustentação do andaime suspenso.

PLATAFORMA DE TRABALHO COM SISTEMA DE MOVIMENTAÇÃO VERTICAL EM PINHÃO E CREMALHEIRA E PLATAFORMAS HIDRÁULICAS

18.15.47.5 Todos os trabalhadores devem utilizar cinto de segurança tipo para-quedista ligado a um cabo guia fixado em estrutura independente do equipamento, salvo situações especiais tecnicamente comprovadas por profissional legalmente habilitado.

CADEIRA SUSPENSA

18.15.52 O trabalhador deve utilizar cinto de segurança tipo pára-quedista, ligado ao trava-quedas em cabo-guia independente.

É preciso dizer que esse cabo-guia (ou linha de vida) deve ser instalado na vertical? Acho que não, né?

E para os andaimes apoiados e fachadeiros? Podemos utilizar a linha de vida instalada na horizontal? Podemos prender os ganchos do talabarte “Y” nessa linha de vida? A resposta é sim.

Resumindo:

-Quando for utilizada a linha de vida na vertical, como no caso de andaimes suspensos ou balanças, deve-se fazer uso do trava-quedas preso diretamente na argola do cinto, sem uso do talabarte “Y”;

-Quando for utilizada linha de vida na horizontal ou pontos de engastes, deve-se fazer uso do talabarte “Y” citado na NR-18.[3]

Desse modo cumprimos o item:

18.23 Equipamentos de Proteção Individual

18.23.3.1 O cinto de segurança deve ser dotado de dispositivo trava-quedas e estar ligado a cabo de segurança independente da estrutura do andaime.

Então a resposta correta da questão acima é a “e”: O cinto de segurança paraquedista:

e)        Dependendo da situação pode ser utilizado com talabarte “Y” ou com trava-quedas.

Desvios técnicos sempre ocorrem quando profissionais deixam que pessoas que não possuem a devida especialização na área ocupem o seu lugar. Segurança do trabalho é ciência em primeiro lugar e legislação em segundo. Por isso precisa de especialistas, de profissionais que pensam e principalmente de prevencionistas.

Bom trabalho.

Webgrafia:

[1] Artigo “Interpretação dos textos legais”

https://heitorborbasolucoes.com.br/interpretacao-dos-textos-legais/

[2] NR-18 – Andaimes e plataformas de trabalho

http://acesso.mte.gov.br/data/files/FF8080814CD7273D014D350F623C3446/NR-18.15%20-%20Andaimes%20e%20Plataformas%20de%20Trabalho%20(limpa).pdf

[3] NR-18

http://acesso.mte.gov.br/legislacao/norma-regulamentadora-n-18-1.htm

[4] Filme do SESI

http://www.cbic.org.br/sala-de-imprensa/noticia/programa-100-seguro-videos-educativos-sobre-prevencao-de-acidentes-seguranc

https://www.youtube.com/playlist?list=PL4_wpZsopCJJ-18x-Dl2hes_FW_UHaSDX

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