Evolução não significa melhoria. Coisas, animais ou pessoas podem evoluir para pior. Foi o caso da CIPA – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes.
A CIPA aprovada pela PORTARIA N.° 33, DE 27 DE OUTUBRO DE 1983 era realmente muito boa e a grade curricular atendia as necessidades de Segurança e Saúde dos Trabalhadores:
“CURRÍCULO BÁSICO
1. O Curso sobre Prevenção de Acidentes do Trabalho, de que trata a NR 5, destinado aos componentes da CIPA – titulares e suplentes, terá carga horária mínima de 18 (dezoito) horas e obedecerá ao seguintes Currículo Básico:
1.1. Riscos Ambientais
a) agentes físicos;
b) agentes químicos;
c) agentes biológicos;
d) agentes mecânicos.
1.2. Introdução à Segurança do Trabalho
a) Acidentes do Trabalho – Conceito legal; conceito prevencionista; outros casos considerados como Acidentes do Trabalho.
b) Causas do Acidentes do Trabalho – atos inseguros; condições inseguras.
1.3. Inspeção de Segurança – conceito e importância; objetivos; levantamento das causas dos acidentes; relatórios de inspeção.
1.4. Investigação dos Acidentes – procura das causas do acidente; fonte de lesão; fator pessoal de insegurança; natureza da lesão; localização de lesão.
1.5. Análise dos Acidentes – comunicação do acidente; cadastro de acidentados; medidas de segurança a serem adotadas; dias perdidos; dias debitados; estatísticas.
1.6. Campanhas de Segurança – SPAT (Semana de Prevenção de Acidentes do Trabalho); CANPAT (Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes do Trabalho); Campanha Internas.
1.7. Equipamento de Proteção Individual – exigência legal para empresa e empregados; EPI de uso permanente; EPI de uso temporário; relação dos EPI mais usados na empresa e as formas de sua utilização.
1.8. Princípios Básicos da Prevenção de Incêndios – normas básicas; procedimento em caso de incêndio; classe de incêndio e tipos de equipamentos para seu combate.
1.9. Estudo da NR 5 – organização e funcionamento da CIPA, preenchimento dos Anexos I e II.
1.10.Reunião da CIPA – organização e finalidade; forma de atuação dos representantes; reunião ordinária e reunião extraordinária; realização prática de uma reunião da CIPA.
1.11.Primeiros Socorros – material necessário para emergência; tipos de emergências; como primeiros socorros.”.
Uma CIPA fácil de montar e de funcionar, com uma grade curricular abrangente, que não pretendia formar especialistas em prevenção e combate a incêndios e tão pouco em primeiros socorros, mas todos os trabalhadores participantes possuíam boas noções dessas práticas essenciais ao chão da fábrica. Só com essa CIPA era possível fazer prevenção. Brigadas de Incêndio com especialistas em prevenção e combate a incêndio, primeiros socorros e prevenção e combate a acidentes ambientais já eram “um extra”. De qualquer forma um membro de CIPA tem obrigação de ter esses conhecimentos, já que a CIPA atua também como órgão fiscalizador.
Mas daí chegaram os ideólogos ao poder e começaram a modificar os tempos e as leis… E quando a ideologia entra pela porta a razão sai pela janela.
No início da divulgação dos casos de infecção por HIV (AIDS/SIDA) na década de 80, apenas homossexuais apresentavam casos de infecção. Daí esse segmento da população foi incluído no grupo de risco para HIV. Isso causou repúdio e até hostilizações aos homossexuais por parte da maioria da população. Com isso o governo, preocupado com o rumo que essa divulgação estava tomando, resolveu emplacar campanhas para desconstrução dessa ideia. Na década de 90 os casos já haviam se alastrado para prostitutas, caminhoneiros, operários da construção civil e até famílias. O problema não era o grupo de risco, mas quem se prostituía. Essas estatísticas somadas a pressão ideológica para desconstrução do grupo de risco e retirada do estigma que pairava sobre homossexuais e prostitutas foram suficientes para uma mobilização nacional. Campanhas na TV, palestras alusivas e até cursos sobre o assunto ministrados pelo sistema “S” foram massificados na época. Eu mesmo participei de um curso ministrado pelo SESI intitulado “Agentes multiplicadores de informações sobre DST/AIDS” (e discordei de muita coisa que foi dita). No entanto, não ficou só por aí. Era preciso consolidar a ideologia na lei. E a bola da vez foi a CIPA, que através da Portaria SSST n.º 08, de 23 de fevereiro de 1999 aprovaram essa besteira:
“DO TREINAMENTO
…………………………….
5.33 O treinamento para a CIPA deverá contemplar, no mínimo, os seguintes itens:
a) estudo do ambiente, das condições de trabalho, bem como dos riscos originados do processo produtivo;
b) metodologia de investigação e análise de acidentes e doenças do trabalho;
c) noções sobre acidentes e doenças do trabalho decorrentes de exposição aos riscos existentes na empresa;
d) noções sobre a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida – AIDS, e medidas de prevenção;
e) noções sobre as legislações trabalhista e previdenciária relativas à segurança e saúde no trabalho;
f) princípios gerais de higiene do trabalho e de medidas de controle dos riscos;
g) organização da CIPA e outros assuntos necessários ao exercício das atribuições da Comissão.”.
Isso mesmo que vocês estão vendo. Substituíram prevenção e combate a incêndio e primeiros socorros por “noções sobre a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida – AIDS, e medidas de prevenção”. Ideologia é uma coisa triste porque embota a razão. Prevenção a AIDS e o atual assédio poderiam muito bem fazer parte das campanhas internas, como ocorre na prática. Mas se for consultar os profissionais as ideologias não viram leis. Por isso nunca abrem esse tipo de lei para consulta pública.
Com as pregações ideológicas sobre AIDS massificadas, alguns profissionais, principalmente Técnicos de Segurança, acabaram se alienando ao ponto de andarem com um pênis de borracha e uma caixa de camisinhas debaixo do braço. O objetivo era ensinar os trabalhadores na teoria e na prática como colocar a camisinha corretamente no pênis. Ideologia também é uma coisa triste porque faz com que o ideólogo pague mico.
Agora é a vez do assédio. Ninguém tem dúvida que a inclusão dos Riscos Psicossociais no PGR foi ideológica e não científica, motivada pela ideologia feminista que potencializa o assédio sexual no ambiente de trabalho. Prova disso é a nova CIPA, que ideologicamente passou a se chamar “Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e Assédio” em vez de “Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e Riscos Psicossociais”. Outra prova pode ser adquirida por meio de um questionário aplicado em escrutínio secreto para que os trabalhadores respondam as perguntas: “Quantos casos de assédio de qualquer natureza você teve conhecimento que ocorreu na empresa nos últimos cinco anos?” Agora mude a pergunta: “Quanto trabalhadores apresentam insatisfação no trabalho?” “Quantos trabalhadores relatam queixas de demandas excessivas, baixos salários e cobranças por metas?” Quais perguntas vão marcar ponto? Façam o teste e comprovem. O assédio é o menor dos problemas. Parece que o governo está tentando corrigir os próprios erros, considerando que a maioria dos casos de Burnout, depressão e suicídio decorrentes de cobrança por metas, insatisfação no trabalho e assédio ocorre nos bancos públicos e nos tribunais de justiça. Basta ver as estatísticas e denúncias. Coagir empregados para aceitarem ideologias sociais contrárias aos seus princípios e valores também é assédio (o mesmo para dinâmicas de grupo constrangedoras). Esses assédios estão sendo praticados principalmente em empresas públicas e privadas de grande porte sob a alcunha de “equidade, igualdade e inclusão”. E por questões ideológicas esses fatores de riscos não estão sendo considerados como Riscos Psicossociais.
E lá vamos nós de novo com uma trupe de profissionais fazendo teatrinhos nas empresas para que “os trabalhadores e as trabalhadoras” (conforme analfabetismo ideológico em moda) possam saber o que é um assédio (só não ensinam sobre os assédios causados pelas coercitivas pregações ideológicas e as constrangedoras dinâmicas de grupo). Fiscalizar a segurança contra incêndios e primeiros socorros, prevenir e combater incêndios e socorrer acidentados no trabalho não é importante. O importante mesmo é prevenir os assédios que o governo acha que existe fora da máquina pública.
A ideologia social conseguiu estragar até a CIPA. Outros assuntos de igual importância, como meio ambiente e qualidade, também ficaram de fora. Sem dúvida que a CIPA evoluiu, mas para pior.
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