Citação de ruído no eSocial – Por Heitor Borba

 

A citação do risco físico ruído no eSocial deve ser realizada por meio de duas metodologias, extraídas de duas fontes, sendo uma trabalhista e outra previdenciária.

Há um paradoxo entre o Manual do eSocial e a legislação previdenciária. Na verdade, o problema se encontra no sistema de coleta de informações do eSocial e tem início no texto abaixo:[1]

S-2240 – Condições Ambientais do Trabalho – Fatores de Risco – 21) A duplicação dos fatores de risco “Ruído contínuo ou intermitente”, identificado pelos códigos ‘01.01.002’ (legislação previdenciária) e ‘01.01.021’ (legislação trabalhista), e “Temperaturas anormais (calor)”, identificado pelos códigos ‘01.01.018’ (legislação previdenciária) e ‘01.01.023’ (legislação trabalhista), na tabela 23, ocorre em virtude da divergência de metodologias e/ou procedimentos previstos nas legislações previdenciárias e trabalhistas para análise e avaliação de tais fatores de risco. Assim, sempre que prestada a informação de tais fatores de risco, será necessário utilizar os dois códigos, observando a legislação de regência.

Constante do Manual do eSocial.[1]

Sendo:

– Código ‘01.01.002’ => Legislação previdenciária => LTCAT;

– Código ‘01.01.021’ => Legislação trabalhista => PPRA, PCMAT, PGR, Laudo Insalubridade e outros.

Apenas esse texto não cria problemas. Semelhante a exigência para citação do calor, que muda apenas o procedimento e a metodologia, mas mantem os mesmos Limites de Tolerância da NR-15, o texto acima pode ser considerado em harmonia com a legislação e a técnica utilizadas para medições de ruído.

No entanto, a coisa se complica na citação do ruído no sistema eSocial:

Tabela s 2240

LEIAUTES DO eSOCIAL – Versão 2.5 – Novembro de 2018.[2]

Mais especificamente nos itens:

Dose ou unidade de medida da intensidade ou concentração do agente:

1 – dose diária de ruído (número adimensional) Q=5;

2 – decibel linear (dB (linear));

3 – decibel (C) (dB(C));

4 – decibel (A) (dB(A));

……………………………………………………..

44 – decibel (A) (dB(A)) NEN Q=3;

Analisando:

1 – dose diária de ruído (número adimensional) Q=5;

Corresponde a dose:

C1/T1 + C2/T2 + C3/T3 + …… Cn/Tn => Cn/Tn < 1 (1 = 100% = 85 dB(A))

Constante do Anexo I da NR-15 (legislação trabalhista)[3], onde o resultado é expresso através de número adimensional (em %), onde o fator de troca utilizado é o 5 (q=5), sendo a dose maior que 1 considerada acima de 85 dB(A);

Também pode ser calculado pela fórmula:

Dproj = D x TE / t

Dproj = Dose projetada para o tempo de exposição real ou da jornada de trabalho;

D = Dose calculada ou medida no aparelho;

TE = Tempo de Exposição ou de duração da jornada de trabalho;

t = Tempo de medição anotado ou registrado no aparelho;

Quando o tempo de medição for inferior ao tempo de exposição ou da jornada de trabalho deve-se projetar a dose para o tempo de exposição total ou de duração da jornada de trabalho.

Onde 1 = 100% = 85 dB(A).

Ou a partir do nível em dB(A):

LT =  5√2(100-L) => LT = 8 / 2 [(L – 85) / 5]  => 100 + 16,61 x log (D / 100) / 8 => D = (T / 8) . 2 [(L-17) / 5]

LT = Limite de Tolerância da NR-15 em horas/dia;

L = Nível de exposição ao ruído em dB(A);

D = Dose em %

T = Tempo de exposição em horas/dia

2 – decibel linear (dB (linear));

Constante do Anexo II da NR-15[4] (legislação trabalhista), onde o resultado pode ser é expresso em dB (linear) ou dB(C), esse último, com aparelho operando no circuito de resposta rápida (FAST) e circuito de compensação “C”;

Também utilizado para citação de níveis de ruído de impacto medidos conforme a IN 77 do INSS (legislação previdenciária).[5] Podemos observar que a unidade dB (linear) também é utilizada na NR-15, mas muda a metodologia, o procedimento e o Limite de Tolerância, que na NR-15 é de 130 dB (linear), enquanto na NHO-01, esse limite é dado pela fórmula:

Np = 160 – 10 Log n [dB]

onde:

Np=nível de pico, em dB(Lin), máximo admissível;

n = número de impactos ou impulsos ocorridos durante a jornada diária

de trabalho.

3 – decibel (C) (dB(C));

Constante do Anexo II da NR-15[4] (legislação trabalhista), onde o resultado pode ser é expresso em dB (linear) ou dB(C), esse último, com aparelho operando no circuito de resposta rápida (FAST) e circuito de compensação “C”;

4 – decibel (A) (dB(A));

Para medições de níveis de ruído contínuo ou intermitente medidos em decibéis (dB) com instrumento de nível de pressão sonora operando no circuito de compensação “A” e circuito de resposta lenta (SLOW), nos termos do Anexo I da NR-15 (legislação trabalhista);[3]

……………………………………………………..

44 – decibel (A) (dB(A)) NEN Q=3;

Para medições de ruído conforme a IN 77 do INSS (legislação previdenciária)[5] que preconiza:

Art. 279. Os procedimentos técnicos de levantamento ambiental, ressalvadas as disposições em contrário, deverão considerar:

I – a metodologia e os procedimentos de avaliação dos agentes nocivos estabelecidos pelas Normas de Higiene Ocupacional – NHO da FUNDACENTRO; e

II – os limites de tolerância estabelecidos pela NR-15 do MTE.

E aqui temos problemas:

No caso do ruído não há como utilizar a metodologia e os procedimentos da NHO-01 da FUNDACENTRO[6] e obedecer aos Limites de Tolerância da NR-15 utilizando o fator de troca q=3 (sim, com “q” minúsculo, mesmo, porque os Fatores de Troca (q) são deduzidos das fórmulas:

q = log2 x 16,61 = 5 => Q = 5/log2 = 16,61 para q=5 dB;

q = log2 x 10 = 3 => Q = 10 para q = 3 dB;

q = log2 x 13,29 = 4 => Q = 4/log2 = 13,29 para q=4 dB).[7]

para exposições que não sejam convertidas para a jornada padrão de 8 horas/dia, conforme artigo “Ruído para LTCAT é com Fator de Troca q=3? ” Somente exposição padrão, convertida por meio do cálculo do “NEN”, atende ao Artigo 279 acima (mas só numericamente).

Para atender ao Artigo 279, a legislação previdenciária manda fazer dosimetria com fator de troca q=5,[8] mas o eSocial pede com q=3 (“44 – decibel (A) (dB(A)) NEN Q=3;”). A Resolução 21 que aprovou a versão 2.5.01 do Manual de Orientação do eSocial que balizou o soft[9] é hierarquicamente inferior a IN 77. E a previdência deve esclarecer esse problema. Claro que a fórmula “NEN = NE + 16,61 x 10 log TE/480 [ dB ]” converte o “NEN” de q=3 para q=5, além do “NEN” (NEN = NE + 10 log TE/480 [ dB ] ou NEN = NE + 16,61 log TE/480 [ dB ]) projetar a dose para uma jornada padrão de 8 horas/dia, com o objetivo de comparar com o Limite de Tolerância da NR-15. Tanto na NR-15 quanto na NHO-01 o Limite de Tolerância para 8 horas/dia corresponde a 100% da dose ou 85 dB(A), mas a energia acústica em q=5 é maior que a energia acústica em q=3. 90 dB(A) em q=5 possuir mais energia do que 90 dB(A) em q=3 e o trabalhador se expõe mais em q=5 do que em q=3. Isso porque a dose em q=3 dobra a cada 3 dB e em q=5 a cada 5 dB. Não é mesma coisa. A Tabela dos Limites de Tolerância da NR-15 apresenta um erro matemático, mas lei é lei. Diante disso, a previdência social deveria informar que no caso do ruído aplica-se apenas o Limite de Tolerância da jornada padrão, convertido por meio do “NEN” e não todos os Limites de Tolerância constantes da Tabela do Anexo I da NR-15, mas não fez. Deixou essa tarefa ao  encargo de palestrantes.

Finalizando, deve permanecer mesmo o q=3 em dosimetrias de ruído para LTCAT. E ainda vamos continuar convivendo com as incoerências da lei por muito tempo. Matematicamente é impossível cumprir “os Limites de Tolerância da NR-15” e 85 dB(A) NR-15 não é igual a 85 dB(A) NHO-01. Juridicamente, em ambos os casos, a empresa não poderá ser condenada por erros, falta de esclarecimentos ou omissões do governo. A verdade é que esse eSocial está endoidando todo mundo. Esse é o meu entendimento. Caso alguém tenha alguma colocação melhor a fazer, agradeço.

Referencias:

[1] eSocial – Documentação Técnica

https://portal.esocial.gov.br/institucional/documentacao-tecnica

[2] LEIAUTES DO eSOCIAL – Versão 2.5 – Novembro de 2018

https://portal.esocial.gov.br/institucional/documentacao-tecnica

[3] Anexo I da NR-15

https://enit.trabalho.gov.br/portal/images/Arquivos_SST/SST_NR/NR-15-Anexo-01.pdf

[4] Anexo II da NR-15

https://enit.trabalho.gov.br/portal/images/Arquivos_SST/SST_NR/NR-15-Anexo-02.pdf

[5] IN 77 do INSS

http://sislex.previdencia.gov.br/paginas/38/inss-pres/2015/77.htm

[6] NHO-01 da FUNDACENTRO

http://www.fundacentro.gov.br/biblioteca/inicio

[7] Fatores de Troca

Nível de Exposição Normalizado (NEN)

Exchange Rate (ER)/Fator de Troca (q)

[8] Legislação previdenciária, que manda realizar dosimetria com fator de troca q=5

Ruído para LTCAT é com Fator de Troca q=3?

[9] Resolução 21 que aprovou a versão 2.5.01 do Manual de Orientação do eSocial que balizou o soft

http://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/59433263

https://portal.esocial.gov.br/institucional/legislacao 

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