Lean Construction – Por Heitor Borba.
Momentos de crise na construção civil do Brasil. Hora de buscar novos mercados, inovar, aprender, reestruturar e redesenhar o processo produtivo da empresa com extrema necessidade de aplicação da gestão do pensamento enxuto.
Lean Construction ou Construção Enxuta[1] é uma filosofia de gestão da produção adaptada para obras de construção civil. Seu advento se deve ao especialista Lauri Koskela[2], na década de noventa. Os estudos de Koskela sugerem mudança de conceito em relação ao corrente método produtivo utilizado pelas construtoras. A ideia defendida aponta para uma adaptação do Sistema Toyota de Produção[3] (Lean Production) para que possa ser empregado também na indústria da construção civil. Com isso, essa ferramenta foi denominada de Lean Construction.
Para isso, foram adaptados conceitos como os de fluxo de produção e geração de valor.
Após muitos debates entre pesquisadores espalhados por todo o mundo a Lean Construction chega ao Brasil em meados de 1996 amparada por especialistas diversos ligados as áreas de consultoria e gestão da produção.[1]
O pesquisador japonês Ohno[4] identificou sete tipos de fontes de desperdício na indústria da construção civil:
I – Falhas ou defeitos
É sabido que a indústria da construção civil ainda possui um dos mais baixos índices de qualidade de todos os processos produtivos existentes. Os defeitos vão desde a estrutura até o revestimento, com emprego constante de retrabalho para correção de irregularidades. Os defeitos mais comuns são: Estrutura “bichada”, devido a vibração irregular do concreto quando da sua aplicação dentro da forma. Nesse tipo de defeito há necessidade de quebra da estrutura e aplicação de novo preenchimento. Essa falha pode ocorrer por falta de treinamento do trabalhador, forma mal fixada, chicote vibrador com mau funcionamento ou inadequado para o tipo de forma a ser vibrada, etc; aplicação de revestimentos de pisos e paredes sem qualidade, necessitando de remoção, retificação superficial e reaplicação do revestimento, desperdício das madeiras utilizadas na montagem das formas e das ferragens estruturais devido a ausência de um plano de corte eficaz, etc
O desperdício de tempo, materiais e horas trabalhadas, bem como, o desgaste dos trabalhadores justificam o investimento necessário a sua correção.
II – Alta produção
A superprodução gera estoque e despesas desnecessárias, além de expor a equipe aos riscos inerentes a produção sem necessidade. A produção deve ser puxada pelo cliente conforme agregação de valor que o mesmo atribui ao produto, ou seja, o produto deve ser voltado para a necessidade e valoração do cliente. Produzir além da demanda de mercado significa dinheiro parado. Nesse caso é melhor diversificar os produtos como já fazem as grandes construtoras que partiram para construção de versões mais baratas e personalizadas de edificações.
III – Alto estoque
Os insumos devem ser adquiridos a medida que o produto é fabricado. Fazer grandes estoques de matéria-prima, por exemplo, não é um bom negócio, exceto, em raras ocasiões, como é o caso de estoque de cimento e cerâmica, quando se sabe sobre alta de preços futuros. Mesmo assim, há necessidade de se calcular prazo de validade, capacidade de estoque e demanda de utilização na obra. Produção enxuta é produção que utiliza estoque mínimo.
Para máquinas e equipamentos, o armazenamento desnecessário gera imobilização financeira e riscos de perda por armazenamento incorreto, ação do tempo, deterioração, falta de manutenção, etc Nesse caso a melhor opção seria locar com os custos pagos pela obra beneficiada e não pelo administrativo.
IV – Processamento irregular ou desnecessário
Numa obra geralmente é perceptível a ocorrência de processamentos desnecessários, com desperdício de tempo, esforços, energia, etc Verificado principalmente nos serviços de preparação de massas, montagem de ferragens e aplicação de concretos. Esse processo aumenta o tempo de produção do produto e consequentemente o custo de produção e o desgaste da equipe.
V – Movimento desnecessário
Os movimentos desnecessários realizados pelos trabalhadores podem ser grafados por meio do Diagrama em Espaguete.[5] É através desse diagrama que podemos visualizar o desperdício de tempo e energia empregados na realização de determinada tarefa. Esses movimentos podem ser enxugados a fim de permitir a sua otimização, agilizando os serviços com menor perda de energia. Movimentos de trabalhadores durante a execução do processo produtivo que não agregam valor também geram desgaste na equipe, perda de tempo produtivo, cansaço e consequentemente perda de produtividade.
VI – Transporte desnecessário
Os revolucionários transportes verticais e horizontais aplicados por décadas a processos produtivos estão com os dias contados. Transporte é perda de tempo. O ideal é não precisar transportar nada, está tudo à mão, ou transportar o mínimo possível de forma rápida e sem atrapalhar o fluxo normal de produção. Para isso há necessidade de redesenhar o fluxo de produção com criação de lay outs enxutos. A utilização de gruas é um exemplo de transporte rápido e com um mínimo de impacto no fluxo de trabalho da obra.
A movimentação de trabalhadores, materiais, ferramentas, máquinas e equipamentos também aumentam o tempo de produção, ocupam a mão de obra com atividades que não agregam valor, geram custos de energia ou combustível desnecessários, etc
VII – Alto tempo de espera
O tempo decorrido entre o início do processo produtivo (que começa na aquisição de matéria-prima) e o momento em que o dinheiro do cliente entra na conta da empresa é essencial para definição de um processo produtivo eficaz. Quanto mais tempo a empresa demora a receber o dinheiro do cliente mais ineficaz é a gestão da produção. É necessário reduzir ao máximo esse tempo. De preferencia que pelo menos parte do dinheiro já esteja na conta da empresa antes mesmo do produto ser entregue ao cliente. Numa economia instável como a que estamos enfrentando nos dias atuais, isso impacta e muito na saúde da empresa. Os trabalhadores nunca devem ficar parados durante o expediente devido a espera de recursos, sejam eles físicos ou humanos. Com isso a empresa perde produtividade e aumenta seu custo.
A solução para eliminar o desperdício é o Pensamento Enxuto. Essa ferramenta de gestão pode ser resumida em:
1) Determinação precisa do valor do produto[6]
O que tem valor para uma pessoa pode não ter para outra. Por exemplo, eu não gosto de futebol e de carros com teto solar. Sendo assim, ingressos para partidas de futebol e carros com teto solar não possuem valor algum para mim. Para outros é uma preciosidade. Nesse contexto, quem diz o valor do produto é o cliente e não a empresa produtora. Por exemplo, colocar área de lazer dentro do condomínio vai agregar valor ao imóvel, ou seja, o cliente vai pagar mais caro por isso? Mesmo que o cliente não pague mais caro por isso, mas vai agregar valor ao imóvel no sentido de influenciar positivamente o cliente na decisão de comprar? É um diferencial?
A determinação do preço tem ação direta no faturamento e rentabilidade da empresa exigindo alterações no seu mercado de atuação. Não existe fórmula pronta para determinação do preço ideal do produto. O que existe são alguns fatores indicativos, como por exemplo:
a) Custos: Determinar o preço do produto em função dos custos fixos e variáveis da empresa;
b) Consumidor: Calcular o preço em função do valor do produto por parte do consumidor;
c) Concorrência: Determinar o preço em função da média praticada pela concorrência;
2) Identificação da cadeia de valor[7]
A identificação da cadeia de valor objetiva especificar para os clientes interno (empregados) e externos (compradores, contratantes) os valores produzidos pela organização. A cadeia de valor também pode oferecer subsídios para auxilio na gestão das diversas áreas ligadas a Engenharia de Produção, como por exemplo, Gestão de Riscos, Planejamento e Gestão de Indicadores, Capacitação de Trabalhadores, Gestão de Documentos, Tecnologia da Informação, Comunicação, Auditoria, Custos e Avaliação de Desempenho. A cadeia de valor deve ser considerada desde as primeiras ações de planejamento para execução da obra ou serviço até o dinheiro da venda ou do serviço entrar na conta da empresa.
3) Cuidar para que o valor possa fluir sem interrupções em todo fluxo de produção[8]
A meta de todas as empresas é produzir mais com menos. São necessárias várias atividades para produzir um bem ou serviço. Todas as atividades devem ser estudadas e melhoradas. O Mapeamento do Fluxo de Valor é uma ferramenta bastante eficaz numa empresa de construção civil, cujas atividades são realizadas de forma quase aleatória. Devem ser buscados melhores resultados com menores investimentos, através da otimização do processo, melhorias referentes a espaço, operadores envolvidos, atendimento ao cliente, custos de estoque e processo. O Mapeamento do Fluxo de Valor, quando bem executado, é comprovadamente eficaz na melhoria do processo produtivo, eliminando atividades que não agregavam valor e combatendo desperdícios.
4) Permitir que o valor do produto seja puxado pelo cliente e não pela empresa[9]
O valor do produto pode ser determinado por meio de pesquisa de mercado, sugestões de clientes, itens mais buscados, etc Daí, a empresa deve partir para as adaptações necessárias em direção ao valor do produto determinado pelo cliente.
Para isso, há necessidade entendimento quanto ao funcionamento do sistema puxado de produção e executar as adaptações necessárias a serem aplicadas a um sistema produtivo sob encomenda; analisar a programação dos setores com o objetivo de planejar a integração dos mesmos; apresentar pontos críticos da integração e apresentar estudos para solução.
5) Implantar a melhoria continua de modo a deixar o processo produtivo mais enxuto possível a cada revisão de metas[10]
Qualquer processo de melhoria continua, por si só, já deixa o processo produtivo mais enxuto. Quando aplicado com esse objetivo os benefícios são bem mais definidos. O método da melhoria contínua baseia-se na filosofia de que sempre é preciso melhorar ou melhorar sempre, continuamente. Ou seja, cada dia busca-se melhorar o que já está bom. Isso é importante porque num mundo globalizado, onde a cada dia surgem novas tecnologias e novos desafios, há necessidade de dinamizar o processo produtivo para que o mesmo não seja ultrapassado. Nem que seja apenas um ajuste no processo ou uma melhoria na capacitação do trabalhador, mas sempre há o que melhorar.
Resumindo, não há fórmulas prontas para a implantação da Construção Enxuta. Mesmo sendo empresas de atividades semelhantes há variação no processo, no cliente, no valor do produto, no mercado, no tipo de financiamento, nos recursos físicos e humanos utilizados, etc
Os princípios da produção enxuta e suas ferramentas se baseiam em cinco princípios fundamentais que formam a base para todo pensamento enxuto (Womack e Jones, 2004)[11]:
1) Embutir valor aos produtos segundo a valoração dada pelo cliente evitando que seja fornecido o que ele não está disposto a pagar;
2) Mapear o caminho que o produto percorre no fluxo de valor, identificando as atividades que não agregam valor e eliminando as desnecessárias;
3) Deixar que as ações necessárias para agregação de valor possam fluir suave e continuamente sem interrupções estabelecendo fluxo contínuo;
4) Produzir somente quando o cliente sinalizar sua necessidade visando eliminar a produção em excesso;
5) Buscar a perfeição através da melhoria contínua alcançando o fornecimento de valor conforme a visão do cliente.
Agora vamos enxugar para não fechar. Boa Gestão “Lean Construction”.
Webgrafia:
[1] Lean Construction
http://www.abepro.org.br/biblioteca/enegep2008_TN_STO_069_491_11816.pdf
http://www.abenge.org.br/CobengeAnteriores/2003/artigos/DCS554.pdf
http://pt.wikipedia.org/wiki/Lean_Construction
http://ergotriade.com.br/os-7-desperdicios-do-conceito-lean-thinking-pensamento-enxuto-do-stp/
http://www.deciv.ufscar.br/tcc/wa_files/tcc2012-felipe.pdf
https://leanconstruction.wordpress.com/historico-lean-construction/
http://www.uniube.br/institucional/unitecne/downloads/arquivos/a_determinacao_do_preco.pdf
[2] Lauri Koskela
[3] Sistema Toyota de Produção
http://www.scielo.br/pdf/prod/v5n2/v5n2a04
[4] Taiichi Ohno
http://www.leanway.com.br/historia%20do%20lean%20system#content-header
http://pt.wikipedia.org/wiki/Taiichi_Ohno
[5] Diagrama em espaguete
http://www.administradores.com.br/artigos/negocios/diagrama-de-espaguete/69434/
[6] Determinação precisa do valor do produto
http://www.uniube.br/institucional/unitecne/downloads/arquivos/a_determinacao_do_preco.pdf
http://www.ief.com.br/forpreco.htm
[7] Identificação da cadeia de valor
http://www.sobreadministracao.com/cadeia-de-valor-o-que-e-e-pra-que-serve/
[8] Cuidar para que o valor possa fluir sem interrupções em todo fluxo de produção
http://www.producao.joinville.udesc.br/tgeps/tgeps/2010-01/2010_1_tcc26.pdf
http://www.producao.joinville.udesc.br/tgeps/tgeps/2010-02/2010_2_tcc36.pdf
[9] Permitir que o valor do produto seja puxado pelo cliente e não pela empresa
http://www.ufjf.br/engenhariadeproducao/files/2014/09/2010_1_Luciana.pdf
http://www.lean.org.br/leanmail/102/as-dificuldades-do-sistema-puxado.aspx
http://www.producao.joinville.udesc.br/tgeps/tgeps/2010-01/2010_1_tcc23.pdf
[10] Implantar a melhoria continua de modo a deixar o processo produtivo mais enxuto possível a cada revisão de metas
http://www.pg.utfpr.edu.br/ppgep/anais/artigos/eng_producao/53%20SISTEMA%20DE%20CUSTO%20KAIZEN.pdf
http://www.aedb.br/seget/arquivos/artigos12/60616875.pdf
http://www.revistasg.uff.br/index.php/sg/article/viewFile/V7N1A7/V7N1A7
[11] Womack e Jones
https://nc400.files.wordpress.com/2012/02/womack-jones-e-ross-1992.pdf
Comentários